Você acredita que determinada região do Brasil fala um português mais bonito ou mais correto do que outras? Ou que existe jeito certo e errado de pronunciar as palavras? Se a resposta é sim, talvez vocês esteja sendo afetado pelo preconceito linguístico sem perceber.
Que o Brasil é um país de desigualdade social não é novidade para ninguém. O contraste existente, entre bairros nobres e favelas em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro pode ser constatado em uma caminhada de poucas quadras. Um país onde uma pequena elite dita as normas para uma massa de pessoas desprovidas do básico que são marginalizadas. As consequências deste modelo de sociedade são inúmeras. Porém existe uma forma de discriminação, que apesar de sutil é uma das mais danosas, por anular o que o outro tem a dizer na fonte, quando as frases ainda são formuladas. O preconceito linguístico.
O preconceito linguístico se caracteriza pela discriminação da linguagem falada por grupos marginalizados da sociedade. No Brasil se observa a prática principalmente com a fala dos nordestinos e moradores de periferia. Diferente das outras formas de preconceito, o linguístico ainda é visto como inofensivo ou justificável.
É impossível tratar do tema sem citarmos o trabalho de Marcos Bagno, professor, doutor em filologia, linguista e escritor do livro “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz”.
Em seu livro Marcos Bagno explica que “O preconceito linguístico é um tanto mais poderoso porque, em grande medida, ele é invisível, no sentido de que quase ninguém se apercebe dele, quase ninguém fala dele, com exceção dos raros cientistas sociais que se dedicam a estudá-lo.”
Na obra, Marcos lista os inúmeros mitos criados acerca da unidade linguística no Brasil e descreve como a gramática normativa transformou-se em ferramenta de controle e segregação. Aqueles que possuem o domínio da norma culta classificam como inferiores aqueles que se comunicam através de variantes de menor prestígio.
Mesmo as escolas e centros acadêmicos que deveriam ser a vanguarda e levar a igualdade através da educação, falham em preparar seus alunos para a diversidade cultural que existe de norte a sul do país. Deve-se abandonar a nomenclatura de certo ou errado para classificar a variedade do português pronunciado em cada região. Existem sim ocasiões que a linguagem formal é aconselhável, porém este não pode ser um limitador no direito de se comunicar e expressar das pessoas.
Um exemplo da discriminação é como a sociedade entende e respeita a licença poética na arte produzida pela elite intelectual mas despreza a cultura produzida pelas massas, como a música caipira e o Rap que por muito tempo foram vistos como arte de menor valor por possuir linguagem própria.
O preconceito linguístico está diretamente associado às outras formas de preconceito, racial, de gênero, socioeconômico, regional e etc. Invariavelmente ao discriminar alguém pela sua forma de falar você está discriminando a sua cultura e suas origens. Em um país onde o acesso a educação de qualidade ainda não alcança uma grande parcela da população, condicionar a ascensão social ao emprego da norma culta é engessar a estrutura social existente e contribuir para a perpetuação das desigualdades. Não deve-se confundir o erro gramatical com erro de português. A função primordial da linguagem é a comunicação, o que transcende regras predeterminadas. Reconhecer a diversidade linguística e cultural brasileira é o primeiro passo para uma sociedade de inclusão.
Gabriel Lacerda
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